sexta-feira, maio 20, 2005

Um padre maluco bateu no meu carro, graças a Deus só quebrei uma unha.

Blog desativado até o ressarcimento do seguro.

domingo, maio 15, 2005

Noites ou noivos
Noite era e seria nessa noite. Juliano agarrava com suas unhas as mangas molhadas do agasalho preto, presente de Ana em passado recente; ele, ainda na porta de casa, olhava o frio noturno com o desprezo ardente de quem ama, de quem define um rumo quando inexistem alternativas ou escolhas vivas.
Nada não se esconda: ele a pedirá em noivado - o próprio título denuncia -, ele até mesmo já carrega os anéis nos bolsos. Os anéis estão frios, mas é do suor gelado das mãos de Juliano. Ode à ansiedade; a distância até o restaurante seria longa, mais longa até que o gelo umidecido que escorria por seus braços, que chegava até seus dedos apertados nas mangas do agasalho preto presenteado por Ana. Ano a ano Ana lhe dava mimos, dava-lhe sinais ou sinos de seus sentimentos; os últimos talvez os tenham definitivamente unido e agora os levavam, a ela e a Juliano, à esta última atitude desesperada.
No escuro, o som dos passos passa despercebido somente para aqueles que não dão a devida importância à poesia dos solos, ao ritmo das solas. Ritmo hipnotizante que num solo tocava as lembranças de uma história de amor e retocava uma estória imperfeita. Há quatro anos era março, podendo ter sido novembro, Juliano reencontrara Ana que reencontrara aquele Juliano que uma vez amara. Ambos, sem palavras, tinham muito a dizer e declararam ser o beijo o texto ideal do coração.
Noite de padaria, de suspiros e sonhos: reatavam cada um com seu destino, que de um era o do outro. O começo de uma intimidade iniciada não agora no fim, porém antes, muito antes; nos tempos idos da primeira escola, quando não se falavam pois eram o oposto de uma mesma moeda e, justamente por isto, virados para lados diferentes. Ana e Juliano eram os mais da turma: ela, a mais bonita, a mais charmosa, a mais inteligente, a mais estudiosa; ele, o mais ardiloso, o mais invejado, o mais exibido, o mais odiado. Não que o odiasse, mas ela não gostava dele; não que não gostasse dela, mas ela não atraía sua atenção.
No fim, foi exatamente por isso que aquele março surpreendeu tanto um quanto outro, pois seus olhares haviam mudado, eram agora ternos, olhares que acariciam e que declamam poesias, a moeda virara do avesso e as faces se atraíam, o mundo externo desmoronara (ou, se continuava de pé, pelo menos sua importância ruíra).
Naquela rua, a brisa gelada abria caminho para as memórias de Juliano, deixava de atormentá-lo com sentidos superficiais do corpo, deixando os sentimentos da alma almejarem o controle da rota, sentido sul da rua, iluminada pela calma da lua e pelo som do luar.
Nisso tocou os bolsos com o coração em pânico, ufa!, estavam ali os anéis. Indeciso e contraditório ficou mais nervoso. Apertou o passo com medo de parar, e cada vez com mais temor de chegar ao destino. Como o restaurante se aproximasse, suas luzes já o tocavam, atravessou a rua - estava a ponto de atravessar o limite de sua liberdade, de seus sonhos individuais. Sim, ele irá entregar o anel no final, isto porém não o impede de ter suas incertezas e seus momentos de hesitação no entretanto.
Naquilo que pareceu uma eternidade, lembrou de todos os seus encontros com Ana, um a um, ali mesmo na calçada caçava ele as felicidades que o levavam até aquele penhasco do comprometimento, pulava do conforto do ser livre para o espaço desconhecido de uma escolha, daquelas escolhas que decidem o itinerário do futuro. Mas, afinal, isto é ser livre, não? Poder tomar quantas decisões que quiser... e ele queria! Atravessou a rua decidido, entrou no restaurante e sorriu.
Nada mais o impediria, já contavam cinco anos de namoro e se amavam - a adrenalina todavia o sufocou quando ela lhe respondeu o sorriso com aquele rosto tão encantador. Nádia estava linda! Ela era perfeita para ser mãe de seus filhos, pensava Juliano mexendo nos anéis dentro do bolso, como que querendo desenroscá-los, como se pudessem estar enroscados. Ela arrumava seus cabelos que pareciam sempre insatisfeitos com o lado em que estavam.
Nenhum inconveniente; tudo correu bem e, como já mencionado, com um longo e belo discurso apoiado nos sentimentos mais profundos enraizados em alguém que ama, Juliano entregou o anel para Nádia com os olhos molhados e brilhantes, espelhando assim a face dela, a face da pessoa amada. Nádia observava o esperado anel em seu dedo, Juliano pensava em seus desesperados dedos na manga do agasalho preto. Estava feito, dali sairiam para comemorar os frutos do que há anos cultivavam, festejariam por dias com a excitação do acontecimento, transbordariam taças e secariam gelos. O programa era uma viagem? Que não tivesse destino, que não tivesse paradas, seria o fluxo entre os dois que trariam o mundo para onde estavam, não precisariam de mais combustível que um sussurro ao pé do ouvido, que um gemido no odor das mãos...
"Não!" Disse Nádia, olhando aquele mesmo agasalho preto que não fora presente seu, olhando para aquele homem que nunca lhe pertencera. Por alguma razão ela o compreendera, talvez porque o conhecia; um dejà-vu de pensamento ocorreu em Juliano, que imaginara esta reação de Nádia milhares de vezes durante aquela semana, talvez porque também a conhecia.
Num misto de constrangimento/realização/insuficiência respiratória, Juliano se levantou e abraçou sua ex-futura mãe de seus filhos, seu ex-futuro. Ela até que se comportou bem, sem explicações ou sem exigências aceitou os beijos e abraços de Juliano e saiu porta afora, impassível, digna, superior. Ele voltou a se sentar, contraditório ou não, estava mais calmo; largara o apoio das mangas do agasalho.
Ninguém o olhava, e ele tinha em si todos os olhos do mundo; e o mundo voltara a lhe pertencer, seu amanhã não estava mais marcado, ele não tinha mais Nádia, nada mais o separaria de Ana, que fora quem lhe dera aquele agasalho preto, que fora quem lhe devolvera a infância e nunca lhe tomaria o futuro. Nádia, que o amou ao longo dos longos últimos cinco anos, Nádia levou a aliança, mas deixou a liberdade com Juliano, deixou a incerteza, o indefinido, a beleza de um talvez. Ele, talvez, não teria mais a mãe de seus filhos; e tinha mais que isso, tinha a Ana, tinha seu fôlego de volta; ele ficou com a possibilidade, com o que não se sabe, com frio; ele ficou no restaurante com sua vida ironicamente restaurada.
Naturalmente, ele ficou para pagar a conta.

Algumas dicas de como se aproveitar a Europa

- Não comer/ouvir/ver/lembrar/beber nada que lembre o Brasil,
- Entrar em todas as Igrejas possíveis, 99% é de graça e são as construções mais legais das cidades (fora dois ou três monumentos principais). Permanecer pouco tempo entretanto, pois há sempre uma a cada duas quadras.
- Comer: Goffres de chocolate em Barcelona, Dönner onde quer que os encontrem (mais normal na Alemanha), Sorvetes italianos, chocolates suíços.
- Observar as conversas das pessoas em pontos de ônibus, filas, metrô, mesmo sem entender nada, imaginar o que elas devem estar comentando, é mais fácil de advinhar do que se pensa.
- Beber a bebida típica de cada país visitado.
- Ouvir rádio e ver um pouco de TV em cada país, é estranho ligar a televisão às oito da noite e não estar passando o Jornal Nacional.
- Observar tudo, casas, beiras de rio, nuvens, cores, som do vento, e marcas de alimentos nos supermercados, tudo diferente.
- Quando estiverem se acostumado com o ambiente ao redor e começarem a se cansar, digam-se internamente o nome da cidade em que estão: "nossa, isso é Paris!". O ânimo melhora e tudo volta a ser novidade, até ponta da calçada, que por ventura tenham acabado de tropeçar, volta a ser interessante.
- Rostos, olhem os rostos.
- Perguntem direções na língua do país, mesmo que não queiram ir pra lugar algum, perguntem por esporte onde é o metro mais perto, a padaria ou a rua tal.
- Rios, toda cidade européia tem rios, ouçam-nos.
- Matem tempo em bancas de revistas.

sábado, maio 14, 2005

Em virtude da viagem dos meus pais, crio a série de menos de dois capítulos intitulada De como se aproveitar a Europa, com estréia prevista para amanhã por volta de duas da tarde, não percam!

quinta-feira, maio 12, 2005

Por que não comestes do alface?

Eu fiz o strogonoff, cortei carne desdas quatro da manhã, pus pra cozinhar, juntei o creme de leite e tudo mais, diz que depois disso não pode deixar ferver, pois não ferveu; descasquei as batatas, cortei em cubinhos como sugeristes, para que depois de fritas ficassem sequinhas; o arroz, sim, aprendi a fazer arroz, aprendi a não deixar a cebola queimar antes do tempo (descasquei cebola hoje, sabíeis?), enchi a panela de água e ela evaporou e eu tirei o arroz da panela e o coloquei na vasilha de vidro (vasilha que me destes, lembrais?); o suco: o suco comprei, admito, não havia mais tempo para buscar frutas, faltaram-me mãos para prepará-lo, faltou-me preparo para calcular a divisão de tempo nas tarefas; pois então, comprei o suco, dos mais caros, de pêssego com soja, diz que faz bem para o coração - sim, preocupo-me com o vosso coração... que mais?.. guardanapos, não haviam guardanapos; nem guardanapos nem enfeites para a mesa. Aqueles soldadinhos que eu disse serem a imagem do amor a algo maior - foi o que pude inventar com o que tinha em casa; e o papel higiênico ultra-macio com cheiro de pêssego calhou bem como guardanapo, combinou com o suco, nisso concordamos. Pois servi a mesa conforme os padrões da belle cousine francaise, da qual não sois fã, mas sei que admirais les grands chefs, e diagramei tudo para que vossos braços não fossem impedidos de amplos movimentos durante as elocubrações filosóficas do pós-manger. Eu perdi mais que uma manhã, eu perdi uma noite inteira sem dormir a pensar em todos os passos, em todas as alternativas que por ventura apareceriam durante a salada. Sim, nem precisei lembrar-vos que a salada vinha apenas após o prato principal, tive entretanto de bater o pé em vista de vossa insistência em deixar o strogonoff para o final, para deixar aquele gostinho bom na boca; e foi aí minha perdição. Por que vos negastes o alface? Fazia parte do roteiro, se o mocinho não mata o bandido, não pode beijar a mocinha no final! Estava tudo nos conformes até a "bendita" recusa do alface entrar em cena; era ali, durante a salada, que eu diria tudo que ensaiara por semanas, era ali que descobriríeis o quanto vos quero bem; eu começaria dizendo "Pri, preciso te dizer uma coisa", no que responderíeis, com certo olhar desconfiado, um simples "Fala"; e eu falaria, sim, ah! como enfim eu falaria...
Mas, por que, deus do céu!, por que não comestes do alface?

segunda-feira, maio 09, 2005

Nunca deseje para si o inacreditável, pois quando ele acontecer, você não irá acreditar mesmo...

sábado, maio 07, 2005

(continuação)
Anna del Nacho possuía fios de seda, naquela cor de porta de parede, na cabeça. Eram, na realidade, a porta da perdição, pois aqueles cabelos macios, quando entrelaçados na mão de Malakatan, flutuavam sobre seus dedos com vida própria, fugiam de sua ânsia, fugiam de sua cobiça. E era só o começo pois, não os olhos, mas o olhar, o olhar dos olhos era o pecado final; ali o diabo metera o dedo, Deus não criaria obra de uma malícia tão sublime, pensava Malakatan (que acreditava em Deus, e não acreditava que ele pudesse ter criado uma obra de uma malícia tão sublime); e continuava absorto pensando em sua sorte.
Anna curou seus pés feridos; ela os lavava todas as tardes com poeira de pó, conforme indicado por Malakatan, eram para cobrir os furos das bolhas!, dizia ele, pois as bolhas, quando estouram, deixam furos! afirmava.
Anna também curou seu coração. Ou, pelo menos, anestesiou o desconforto que ele sentia ao ver que o sol partia, mais um dia, e ele ainda não completara seu objetivo, que ainda não sabia qual era, mas que quando fosse completado saberia.
Anna era alta como as Annas da Espanha; e, como todas as outras Annas da Espanha, nascera espanhola. Descendente do grande vice-cônsul de Mallorca Vicente Sinon del Nacho, que vencera a Batalha dos Pirineus com um simples Sim e um simples Não (não simultaneamente, esclareça-se), Anna herdara a obsoleta peculiaridade de beber água sempre que estivesse com sede.
Malakatan não sabia que não encontraria beleza igual àquela, e, sabendo disso, decidiu permanecer por mais dois sóis com Anna del Nacho. Após esse período, pensando estar sendo injusto com a lua, continuou mais dois ciclos lunares completos na capital da Catalunha.
Anna? Anna o abandonou na primeira lua cheia, aquele cigano fedido já enchera o saco.
E Barcelona ficou para trás...
Ah! Injusta Anna...
(continua)

sexta-feira, maio 06, 2005

France
Le miroir est carré,
c´est la première frase
que j´ai apris
Tout que après est passé
n´est point mon avis.
Comment ça va?
Il´y a du pain?
Je ne sais pas,
personne est vain!
Comment on dit en France
a tout le monde,
nous avons de bonne chance!
Pour aller a Paris
Pour la voir vis a vis
Il faut q´on dance!

quinta-feira, maio 05, 2005

DEUTSCHLAND
In Deutsch, zaehle Ich bis sieben,
Ich bin da wenig geblieben
Wo denn war Ich?
Sag aber nicht!
Es hat mir gut gefaellt
Ein land so alt...
Europa ist Kalt!
Vielem hab' Ich's erzaehlt
Die Leute ganz und gar
waren mir wunderbar

Nie werde Ich vergessen
was da hab Ich gegessen
Doenner, Doenner, Doenner
Turkisches Sandwich
Doenner, der Loehner
vergesse Ich nicht!
Eine Land des Geschichte
Grosse Vergangenheit
Einem Thema so Breit
Sag Ich nichts; Ich dichte!
Deutschland sieht so aus:
Mitte Europa, ein Haus
wo drinkt Leute nicht Wein
aber fuer Bier,
da oder hier,
die sagen nie Nein!

quarta-feira, maio 04, 2005

USA
I know I gooo
and I know you're going dooown
I gotta show it sooo
and I want to show it noooow
[slow]
The suuuun without the moooon
My laaand went to the toown
todaaay just walls and boooms
my God, they call it cloooown
[normal]
I want to knoooow it
I want to show my cloooown
I know, above, the moon think,
the sun will turn arooound

They all saay like in a soooong
we gotta work, become strooong
I believe it's true, but I think
this bullshit is wroong
As soon
as I catch the sun
I burn the moon,
forgot my gun,
though in this room
I would have to run.

segunda-feira, maio 02, 2005

(continuação)
E por que Malakatan passava as tardes a se questionar, se não desejava obter resposta alguma?
Com caminhos divididos, dividiu-se também a atenção do sol para com o grupo de ciganos; a tensão ficou com o solitário do Malakatan que logo alcançou os campos gelados do quente inverno catalão. Pôde se sentar "en las ramblas" por volta do meio dia, dia meio cinza aquele. Em Barcelona permaneceu até o verão, que, por acaso, começou no dia seguinte - acontecem dessas coisas na Espanha -; e as pessoas ficaram coloridas. E coloridas ficaram as cores.
Dormindo em uma viela estreita do bairro gótico, encontrou outros tão "outros" quanto ele, anônimos, como se não possuíssem nomes; havia um mundo ali no meio. E foi por meio da língua espanhola que Malakatan conheceu Anna del Nacho; e Anna del Nacho esfregava tomate no pão no café-da-manhã.
(continua)