sábado, junho 11, 2005

Só tu e você consigo

O som do mundo
toca no azul
um rouco veludo
te chama pro sul
quem não te viu
que te acha assim
buraco vazio
ou batom tardio
ou leito de rio
do lago sem fim
As caras se viram
pro ferro que cala
que cala o que viram
no tapete da sala

E você continua
na merda, na rua
num ritmo lento
soprando pro vento
que foge da lua

Você acorda na cama
vê a corda afinal
que te prende na lama
que pro fundo te chama
te mata de mal
Tu logo levantas
tu vês as feridas
Você e as formigas
que não eram tantas
A ponte que cai
a cerca que tomba
morta pela bomba
que matou seu pai
a estrada não vira
sem curva no fim
cem pontos no rim
pois alguém não vira
o carro que vinha
que foi e que tinha
mil mortes assim

E você continua
na merda, na rua
num ritmo lento
soprando pro vento
que foge da lua

A sombra do sangue
no acostamento
o sopro de cheiro
de podre do mangue
avisa aos passantes
que ali, pouco antes
Acidente de aço
rasgou rim e baço
do fim de alguém
que não vira na hora
e o cemitério decora
para todo o sempre
a partir de agora
Você com seu tu
pelado, rasgado
molhado e nu
Tu sabes que juros
são pagos seguros
mas comem o arroz
de quem lá não pôs
buracos nos furos

E você continua
na merda, na rua
num ritmo lento
soprando pro vento
que foge da lua
e foges de ti
de si pra consigo
dó lá no que ri
mi faz ré castigo
rói tranças no sol
ou danças no pó
todos desistem
permaneces só
nenhum resta
nem uma dó
pra passar desta
pra uma melhor

E você continua
na merda, na rua
soprando pro vento
do acostamento
da calçada nua.
Tu corres do céu,
o sangue réu
da carne crua.
E na merda, na rua,
você ergue o rosto
de raiva e desgosto,
mas você continua.
Consigo, na sua.