quinta-feira, setembro 22, 2005

Fora de si

1.
E foi num dia de sol que o sol se pôs. Morreu calado, deixando-me só, preso às quatro luas que não se ergueram. Fiquei olhando-as e não subiram; gritei e não me responderam. Sufocado pela humilhação de ser deixado de lado, prendi a respiração (prometi respirar de novo apenas quando alguém me desse ouvidos). Esqueci-me do detalhe de que, com a boca fechada, sem soltar o ar pela garganta para que as cordas vocais vibrassem, som algum sairia. O problema não foi que disso me esqueci, o problema foi que não me lembrei a tempo. Morri num fim de tarde de um dia de sol, sem que astro nenhum me velasse.

2.
Doce sol que nunca mais voltou, nem quando acordei; na minha cama, acordei. E, de pé, me vi deitado. Eu dormia; eu tinha os olhos abertos em mim e o observava, aquele eu deitado. Tentei olhar-me, não me achei. Eu era apenas visão.

3.
O mundo era preto e branco, com tons de rosa na respiração - não na minha, na de mim ali deitado. Embora tudo isso pareça sem sentido, eu tinha apenas um, somente via. Da altura de alguém em pé eu olhava para todos os cantos do meu quarto, sem vontade de gritar, ou de quebrar os móveis indignado, ou de ir ali me acordar. Não, que é isso, deixe-me dormir.